segunda-feira, 24 de março de 2008

Pitotós



A jovem senhora estava muito feliz com seus bebês. Eram gêmeos, um machinho e uma fêmea. Dormiam em berços dourados, em lençóis suntuosos, seus quartos eram decorados com muito luxo. Suas roupas eram feitas sob encomenda e eram todas muito finas.

Cresciam a olhos vistos. Eram porquinhos saudáveis, com bochechas rosadas e gordinhas. Iam sempre passear com muito cuidado para não tomarem uma gota de chuva ou sujarem a roupinha, sua mãe tinha receio de alguma contaminação. Apesar de humana, era com muito zelo que cuidava de suas crianças e não se arrependera da escolha que fizera. Não em relação aos filhos. Já quanto ao marido... Nunca deveria ter se casado com um porco. Seus pais foram contra desde o princípio. Ela, como toda mulher apaixonada, não lhes dera atenção. Até hoje não a procuravam mais, e ignoravam completamente os netinhos.

Sofria um certo preconceito, vivia sozinha com os criados e os filhos, ao sair à rua notava os olhares enviesados. O mundo sempre fora assim... não admitia misturas de raças ou classes sociais. Isso a preocupava um pouco com o futuro pois teria que orientá-los muito bem para que não fossem vítimas de indivíduos impiedosos. Sabia o quão cruéis poderiam ser as crianças, mais ainda até que os adultos.

Apesar da paixão arrebatadora, seu casamento durara pouco. Seu marido não era um porco somente no aspecto físico, mas agia realmente como um. Bebia, enxovalhava-se, não adquirira bons hábitos de higiene, chegara até a bater-lhe certa vez. Isso demonstrou que aquela era a hora de dar um basta. O amor é maravilhoso, mas acaba por ocultar os defeitos do outro. Só a convivência diária traz a cruel realidade.

Após muita confusão, idas e voltas, separaram-se definitivamente. Tentaram ainda contornar a situação, pensando nos bebês, à época recém-nascidos, mas não foi possível. Seu agora ex-marido voltou para a pocilga em que vivia com sua família e ela continuou na grande mansão.

A forma como o seu marido agira servira para torná-la convicta e obstinada na boa educação que daria a seus filhos. Infelizmente, não conseguira evitar o contato deles com o pai. No fundo sabia que não seria justo afastá-los completamente. Sujo ou não, mal educado ou não, continuava sendo o pai. Mas a cada final-de-semana que os via sair juntos a passeio, sentia um aperto no coração. Mesmo não os acompanhando, sabia muito bem o que faziam nesses dias. Enchiam-se de lama, comiam besteiras, o pai dava-lhes liberdade total e todos esqueciam completamente das boas maneiras. Por mais que orientasse seus filhos antes dessas saídas, seus conselhos não surtiam efeitos. E voltavam cansados, sujos, suados e contentes. Que poderia ela fazer? Rezar para que não tivessem os instintos paternos. Amava-os tanto que lutaria até o fim de seus dias para que fossem nobres e comportados. Haveria de mostrar a todos!

Nenhum comentário: