segunda-feira, 24 de março de 2008

Competição

Em instantes seria dada a largada. Essa prova seria uma das mais importantes de sua carreira. Estava orgulhoso de sua triunfante trajetória e era considerado um dos favoritos. Possuía a certeza da vitória, essa convicção sempre o impulsionara.

Seu animal estava bem preparado. Alimentara-o com o que havia de melhor para deixá-lo saudável e vigoroso. As pernas estavam totalmente alongadas e musculosas. As asas suportariam bem, com suas vistosas penas douradas que à primeira vista pareciam frágeis, mas na realidade eram como aço. A visão era capaz de atravessar objetos. Até mesmo o olfato, o sentido mais difícil de ser desenvolvido, estava aguçadíssimo. Sua montaria era a mais bem equipada. Ao menos ele pensava assim. Otimismo e vitória eram as palavras que permaneciam em sua mente.

Pronto. Iniciara-se a grande corrida. Com o impulso que tomaram na partida alçaram vôo em instantes. Cortar o vento daquela maneira era uma sensação maravilhosa. Alcançaram rapidamente as nuvens.

Seus rivais também já estavam bem ao alto. A arrancada era o que menos contava. A resistência, a obstinação, o cuidado e um pouquinho de sorte eram mais importantes, entre outros tantos formatos computadorizados que a maioria possuía. Estavam prontos para o que aparecesse, o perigo e o espírito aventureiro faziam parte do jogo. E os organizadores estavam sendo cada vez mais rígidos nas adversidades.

Logo avistaram uma enorme nuvem negra e quase que simultaneamente os relâmpagos e trovões trouxeram consigo a chuva torrencial. Tanto o cavaleiro quanto seu robusto animal procuraram manter os olhos bem abertos para não perder de vista o trajeto. Nem mesmo o granizo atrapalhou. Estava fácil até então, nada além do esperado.

O que veio a seguir foi mais empolgante. Uma estrela brilhava em toda sua plenitude. Desviaram-se por pouco. Algumas penas chegaram a chamuscar-se nas pontas. Um dos adversários fora esturricado. Um odor terrível impregnava o ar, era o cheiro de carne e borracha queimadas. Dava náuseas e também pena pois deveria ser um de seus conhecidos. Apesar disso, era um concorrente a menos.

Logo um dragão dos tempos antigos surgiu. O fogo que soltava pela bocarra era intenso. Tiveram o reflexo de passar por baixo dele e fora a escolha acertada. Os que subiram sofreram as conseqüências do erro.

Iam muito bem, até enroscar-se na árvore cheia de frutos que, esmagados com o choque, lambuzaram-nos e atraíram os pássaros que davam-lhes violentas bicadas. Conseguiram livrar-se deles, porém perderam um pouco de velocidade. Atrasar-se por causa de uma planta, esfrangalhava os nervos de qualquer um. Era até vergonhoso.

Espantou esses pensamentos negativos e seguiu. Muito aliviado sentiu-se ao avistar o mar. Num mergulho rápido, livraram-se do melado daqueles frutos exóticos e desconhecidos até então. Esperava não deparar-se com eles depois que tudo terminasse, não eram de aspecto nem aroma agradável e, imperdoável, prejudicaram sua performance.

Livres daquela gosma, quase foram tragados por uma enorme baleia de rinha. Novamente escaparam ilesos.

Ainda avistou em meio ao oceano um dos braços do que parecia ser um polvo, daqueles utilizados nos condenados à morte. A baleia era um brinquedo perto daquilo. Felicitou-se por encontrar a ela ao invés do monstro marinho de incontáveis garras.

Escaparam também das crias de demônios, com seus dentes destacando-se na negrura da noite que caíra sobre eles rapidamente. Graças a isso, conseguiam enxergá-los. Era um exercício de velocidade e atenção.

Naquela escuridão, em breve estavam aos trambolhões com outros seres. Não conseguira compreender exatamente do que se tratava, só que eram bastante fortes e vinham de todos os lados. Apesar de em grande quantidade, não conseguiram derrubá-los. Um deles acabou por arranhar o focinho de seu animal. Fora superficial, mas podiam ter passado sem essa.

Foi com grande alívio que avistaram terra, onde poderiam fazer uma breve pausa. Exaustos, precisavam mesmo de um pouco de ar e descanso. Porém, para seu desespero, tratava-se de areia movediça, que os tragou assim que se encostaram à superfície que parecera tão firme. Conheceram o amargo sabor da derrota.

Nenhum comentário: